Comemoração dos Fiéis
Defuntos
Ó mistério insondável, ó
mistério difícil de desvendar. “É diante da morte que o enigma da condição
humana atinge seu ponto mais alto” (GS, 18). Assim é a realidade da Morte,
mistério do qual nem mesmo a ciência foi capaz de mostrar de fato a partir da
realidade empírica o que se passa após a morte, ou se a vida acaba com a morte.
Neste sentido, proponho esta reflexão, no dia em que comemoramos todos os fiéis
Defuntos. Comemorar é sem dúvida trazer a memória do nosso coração tantas pessoas
que encerraram a sua trajetória neste mundo.
Muitos devem se perguntar: porque comemorar o
dia daqueles que já morreram? Podem pensar, tudo passa, nós passaremos, todos
um dia morreremos e com a morte tudo encerrará. Por isso, dizem: vamos
aproveitar a vida da melhor forma possível. Esse é um pensamento fatalista da
morte, ou seja, viver o hoje da vida, sem a esperança de algo que está para
além da realidade humana deste mundo, pensamento este que tem proliferado tanto
em nosso mundo contemporâneo. Ao contrário, Comemorar todos os fiéis Defuntos,
não é apenas lembrar para sentir tristeza ou cutucar uma ferida que dói.
Comemorar é trazer a memória do coração todos os que já não se encontram mais
junto de nós neste mundo, mas que de alguma forma com seus gestos marcaram a
história de nossa vida.
A
tradição de se comemorar o dia de Finados remonta o século II da era cristã.
Desde a origem do cristianismo em que se rezam nas catacumbas era costume se
rezar pelas almas dos mártires. O dia 2 de novembro foi instituído para ordem
beneditina, como dia de todos os fiéis falecidos pelo monge Odilo de Cluny em
998. Posteriormente, no século XII esta comemoração se popularizou no mundo
cristão, sendo celebrada por todos.
Alguns
podem se perguntar por que rezar pelos que já morreram? E ainda afirma: tudo se
acabou com a morte. Este é um argumento dos pensadores modernos. Penso que
nosso Deus não é o Deus dos mortos, mas o Deus dos vivos, uma vez que, todos
vivem para ele (cf. Lc 20, 38), ou seja, nosso Deus nos criou para a eternidade
e não para este mundo, no qual finalizamos nossa caminhada com a morte. Por
isso, todos os que morreram na justiça de Deus, se encontram sem dúvida junto
Dele, pois o próprio livro da Sabedoria (Sb 3,1) nos garante que “A vida dos
justos está nas mãos de Deus” e continua dizendo “Aos olhos dos insensatos,
aqueles que pareciam ter morrido, e o seu fim foi considerado como desgraça. Os
insensatos pensavam que a partida dos justos do nosso meio era um
aniquilamento, mas agora estão na paz. As pessoas pensavam que os justos
estavam cumprindo uma pena, mas esperavam a imortalidade” (Sb 3, 2-4).
Hoje somos convidados a
rezar, portanto, por todos os nossos antepassados, bem como também todas as
almas, principalmente as mais esquecidas, para que purificadas encontrem em
Deus o seu refúgio. De acordo com a nossa fé, não só podemos, como devemos
rezar pelos mortos, uma vez que, acreditamos que mesmo que tenham morrido em pecado,
tem igualmente a chance de se purificar para entrar nas alegrias eternas,
passando pelo purgatório (lembrando
que céu, purgatório e inferno não é
lugar, mas estado que a alma experimenta). A própria Escritura nos mostra esta
realidade do purgatório: “No que
concerne a certas faltas leves, deve-se crer que existe antes do juízo um fogo
purificador, segundo o que afirma aquele que é a Verdade, dizendo, que, se
alguém tiver pronunciado uma blasfêmia contra o Espírito Santo, não lhe será
perdoada nem no presente século nem no século futuro” (Mt 12, 32). Contudo,
devemos rezar por estes que se encontram no purgatório
cumprindo aquilo que nos mostra em Macabeus; “Eis por que [Judas Macabeu]
mandou oferecer esse sacrifício expiatório pelos que haviam morrido, a fim de
que fossem absolvidos de seu pecado” (2Mc 12, 45).
Assim concluo, com o
que disse Blaise Pascal (Pens., 781) “Jesus
Cristo, redentor de todos’. Sim, porque ele ofereceu, como um homem que
resgatou todos os que queriam ir a ele. Os que morrerem no caminho terão sido infelizes;
mas ele lhes oferece a redenção”. Com isso, tenhamos sempre a esperança na vida com Cristo que está
por vir, nunca percamos esta esperança,
não é uma perca de tempo acreditar na Ressurreição. Conforme diz São Paulo, “Se
Cristo não ressuscitou vã é nossa fé, se os que morrem não ressuscitam então
somos testemunhas falsas de Deus” (cf. 1 Cor 15, 14-15). Por isso, vivamos bem
na esperança de alcançar a vida eterna junto de Deus e rezemos por todos os que
já partiram, para que eles também sejam nossos intercessores junto de Deus. No último dia poderemos enfim contemplar
Deus face a face, tal como Ele é, e sermos convidados para o Banquete que nunca
tem fim. Por fim, poderemos festejar juntos enquanto Igreja, novo povo
escolhido e resgatado.
“Nele brilhou para nós a esperança da feliz
ressurreição. E, aos que a certeza da morte entristece, a promessa da
imortalidade consola. Senhor, para os que crêem em vós, a vida, não é tirada,
mas transformada. E, desfeito o nosso corpo mortal, nos é dado, nos céus, um
corpo imperecível” (Prefácio dos fiéis Defuntos I)
Wesley Pires dos
Santos

Nenhum comentário:
Postar um comentário