Hoje
decidi retornar o pensamento há alguns anos atrás. De fato, fazer memória lá
onde tudo começou. Isso mesmo! Foi naquela pequena rua, uma das mais antigas de
minha terrinha Senador Firmino, uma das que primeiro levou o progresso à nossa
Conceição do Turvo, fazendo ligação para sair em Dores do Turvo. A rua mais
conhecida, não tem erro para ninguém! Começa com aquele que leva a balança nas
mãos, nosso querido São Miguel,símbolo do juízo final, e termina já com a
condenação que é a antiga Cadeia. Por isso, Rua São Miguel, ou também conhecida
como Rua da Cadeia ou da Sorveteria.
Sei
que nem todos sentirão a mesma coisa que eu sinto por ela, mas para mim contar
um pouco da minha rua, antiga e sempre nova, das pedras e agora caminhando para
o asfalto, é uma imensa honra, porque nesta rua passa a história de boa parte
dos melhores anos de minha vida até então. Não só o espaço físico, mas principalmente
pessoas, que marcaram e marcam a tão famosa Rua São Miguel. Esta rua assombrada
porque abrigou, há anos, o antigo cemitério; e alegre, pois me viu crescer, me
viu ir embora (este momento foi surpreendente, quando estava indo para o
Seminário a rua quase toda, em frente de casa, parou para me saudar e se
despedir, todos com olhos empapuçados desejando bom caminho), me vê alegrar por
sempre retornar.
Suponho
que nossa rua recebe o nome e a grande proteção de São Miguel porque, conforme
relatos, a antiga capela do primeiro cemitério da cidade tinha a imagem de São
Miguel Arcanjo, que hoje se encontra no Santuário de Nossa Senhora da Conceição
e este Cemitério era dedicado a ele. Podemos dizer que neste lugar habita
sepultados alguns daqueles que foram os sustentáculos de nosso torrão. Por
isso, ao passar pela Rua São Miguel lembremos que ali também começa nossa
história, nunca esqueçamos de nossos antepassados firminenses. Ainda mais, a
rua que dá para defronte do Santuário quer mostrar que nossa terra é sempre
protegida e amparada pelo grande príncipe da Milícia Celeste, glorioso São Miguel
Arcanjo, e está sob o patrocínio constante da Senhora e Virgem da Conceição,
uma vez que o Santuário majestoso sempre está nos convidando à oração. Desta
rua saiu em 15 de agosto de 1893, da antiga casa de Manoel Eugenio de Lacerda a
procissão levando o quadro com a pintura do padre Jacinto Trombert, para
homenageá-lo como benemérito sacerdote. Também de nossa rua saiu o povo em
festa no ano de 1947 saudando em mutirão a posse do primeiro prefeito eleito
Sogê (Geraldo de Oliveira Fernandes). Como podemos ver parte importante de nossa
história passa pela Rua São Miguel.
Com
alegria e gratidão, ponho-me agora a tecer elogios aos grandes heróis que
habitaram e habitam minha rua. Bem longe, ao avistá-la, já se impõe o antigo
casarão onde habitou o saudoso farmacêutico Mário Bezerra e hoje mora a piedosa
senhora sua esposa-viúva, dona Lurdinha. Logo ao lado, fazendo “bico” com a rua
São Miguel, está a casa do grande político, homem de grande honra e história do
município, o senhor Wilson Fernandes, e ao olhar para esta casa onde muitos
enchem a varanda no dia 15 de agosto, não mais podemos ver aquele rosto de fé
de dona Silvinha, mas que permanecerá vivo em nossa memória sempre nos chamando
para as Novenas de Natal. Mais adiante, andando por nossa rua, podemos
encontrar com ele sempre a caminhar e a lutar, Chico Pena, nosso amigo, homem
de fé e de garra. Mais adiante ainda vem-nos à memória o Tarcísio do Correio,
este já falecido e sua esposa, Maria do Telefone, ambos receberam o apelido
pelos lugares onde trabalharam. Mais adiante, tio Joel d’Água, residente onde
primeiro meus avós Geraldo Mariano e Maria de Paiva adquiriram, para morar mais
próximos à Igreja. Depois, nunca me esquecerei da Ana do Correio, que também
próximo a nós morou e hoje mora em Mercês.
Caminhando
mais um pouco, encontramos tia Raquel do bolo e dos doces, que agora enfeita é
vela para os sacramentos. Depois também estão eles sempre animados Pedro
Nogueira e dona Marli. Ao lado está também o Gaudino, sempre na janela nos
assistindo. Não podia me esquecer do tio Albertino do “Buteco” e da Fabrícia
que está sempre a nos alegrar, viaja o dia inteiro no carro parado. Minha mãe,
dona Isaura Mariano,sempre a andar pela rua e fazendo suas arrumações,e meu pai,
Ciro Ambrósio, com seu charutão de pito. Mais adiante está Efigênia, que cuida
sempre do seu quintal, e com seu jeito singelo nos acolhe com um sorriso. Andando
mais um pouco lembraremos sempre das “ititas...”, Dona Quitita e Pitita, que já
abrilhantaram nossa rua, e agora estão no céu. Pitita era antiga cabeleireira,
possivelmente a primeira da cidade e Quitita, mulher de fé e também
trabalhadeira.
Já à
frente, o famoso “Escadão”, que liga São Miguel à Santa Cruz. Este nunca
ninguém vai se esquecer, pois a história de Senador passa lá: são as
brincadeiras e os antigos namoricos. Na sua esquina tínhamos a antiga
residência das “Marques”, onde por último morou dona Nenega. Esta me encantava,
aprendi a gostar da Rádio Aparecida, porque o seu rádio, às 9horas, sempre
anunciava para a rua a Missa do Santuário Nacional e as vozes do Padre Vítor
Coelho. Ao seu lado está minha antiga professora de Geografia, Silvinha
Valente. Em frente tinha ela, Dona Josefina Benedito, antiga freira do SacreCuer
de Marry, que muito me
ensinou nas “Escolhinhas de Reza” que acontecia aos sábados. Não poderemos
nunca esquecer que nesta rua está ele, o primeiro fotógrafo da cidade, o grande
Ormeu Photos. Andando mais um pouco está Sôtero e Licinha, ali muitos
passam para comprar da água ardente, ali nasceu a internet firminense Netstar. Logo após está o Tarcísio Pastor, antigo guarda
do banco do Brasil, em seu antigo casarão. Ali, também tinha um consultório de
ondotologia, morria de medo de passar perto. Porque, por mais que nos descem
balões de mãozinhas, deve ser algum trauma de dentista. Logo em frente nunca esquecerei
nossa grande mestra de fé e de singeleza do canto, dona Lúcia Benedito, que
sempre me apoiou e incentivou a cantar e a rezar. Mais à frente, minha antiga
professora de português, Maria José Moreira, quanta coisa me ensinou. Também por perto está dona Fátima e o “Sô”Julim,
ali ia para ensaiar os cantos para o desagravo ao Sagrado Coração de Jesus. Ao
seu lado, dona Isa Carneiro, foi minha catequista. Logo em frente está nossa amiga Célia Moreira, sempre sorridente passa e logo damos altas risadas. Já encerrando nossa rua,
está, quase caindo, nossa antiga “Cadeinha”, de onde meu avô foi delegado, onde
por muitos anos abrigou os presidiários da região. Por fim, para concluir com
chave de ouro, ainda temos o antigo prefeito com sua torre exuberante, é ele, Achiles
Benedito.
Nossa
rua é assim, de heróis ao extremo, ainda pra completar temos também os que hoje
desejam ser heróis para continuar abrilhantando nossa história e o futuro de
nossa terra firminense e de nossa nação são eles: arquitetos, químicos,
psicólogas, médica, agrônoma, motoristas, engenheiros, professora, seminarista.
Quanta história ali passamos: era pique-pega, pique-esconde, queimadas até
altas horas da noite, escolhinha na garagem e, para fechar a rodagem, ainda
tinham as famosas “missinhas”. Minha mãe ficava doida correndo de um lado ao
outro atrás da gente, brincando também; meu pai, assistindo seu jornal e sua
novela, isso quando não estava na varanda a nos “bizoiar” com o charutão de
papel e seu fumo de rolo. A escolhinha na garagem era uma muvuca só, mas não
dava confusão. Nesta rua também sempre passava pelas manhãs nosso querido Sô
Fizinho do leite, era a hora mais esperada, deixávamos os estudos para passear
de charrete pela cidade.
Nossa
rua vivia sempre cheia, parece que vinham crianças da cidade toda, não havia
sossego. Os adultos sempre reclamavam, mas hoje é um silêncio mais pacato, só
ouvindo os barulhos dos carros. Quanta falta sentirão, em tempos de tanta
confusão, porque antes a alegria não dava espaço, os gritos aos extremos de nós
crianças eram o grande “arco-íris” que fazia ali resplandecer. Toda noite era
festa, começávamos com a queimada no meio da rua, atrapalhando até o trânsito,
que na época também já não era tanto. Depois, logo passávamos aos piques, à
polícia-ladrão e, muitas vezes, encerrávamos com a “missinha”. O mega-fone de
tubos de linha das janelas do casario Mariano sempre anunciava morte, horários
de missas, até a greve dos professores, como uma vez fui solicitado. Ah, e como
se esquecer, tinha também hora cívica, canto do hino nacional e hasteamento da
bandeira no 7 de setembro, além de sair dali também as famosas “bênçãos”. Nós,
crianças, com as jovens de então, fazíamos a Rua São Miguel virar um verdadeiro
parque de diversão.
Foi
ali que amizades cresceram e se firmaram, alguns hoje distantes, mas sempre
conectados por saudosa lembrança. Nunca esqueceremos nossa era sem internet,
porque com isso aproveitamos para brincar, criar laços e raízes e muito mais
para aprender a amar nossa história e nossa terrinha, esses são nossos grandes
valores. Eh São Miguel, no quintal de dona Isaura, minha
mãe, no antigo cemitério, está enterrado meu umbigo.
Wesley Pires dos Santos
2º Ano de Teologia
Posse do 1º Prefeito Eleito, Geraldo de Oliveira Fernandes (Sogê) - Esquina da Rua São Miguel com a Praça Raimundo Carneiro - 1947
Rua São Miguel - Centro - década de 1950.



Ah, Wesley, q lembranças maravilhosas vc tem. Nunca esqueça de sua rua, e nem de sua terra. Bjs no coração 💕
ResponderExcluir